O homem invisível que nunca foi um super-herói.


Andando pelas ruas, ainda de manhã, observei moradores de rua, ainda com fome do dia anterior, implorarem por um pouco de dinheiro para cada carro que parava perto da rodoviária.
Eles conversavam com cada motorista, e mesmo prometendo que era realmente para a comida, eram muitas vezes ignorados, ou então, após muitas promessas, ganhavam em torno de 1 real para se alimentarem.
Comecei a perceber o quanto as pessoas se incomodavam com a presença de alguém fora dos eixos e culpavam os próprios senhores de estarem nessa situação.
Ouvi coisas absurdas como "É claro que eles mereceram, senão não estariam aqui", "Devem ser drogados", "Eles deveriam saber colocar-se em seu próprio lugar." Fiquei horrorizada.
Vi algumas coisas na televisão e na internet sobre pessoas que ajudavam um ou outro, mas sempre à espera de fama, ou algo em troca.
Acho que muitos ficaram decepcionados ao receberem nada mais, nada menos que sorrisos sinceros.
Não era esperado.
Cadê a Eliana? A mídia? Cadê Deus pra me perdoar agora do pensamento ruim que tive?
Tudo troca de interesses.
Mas quando você começa a observar e a refletir sobre tudo, acaba percebendo que essas pessoas não seguiram as regras da sociedade. Ser bem sucedido é o mínimo, né?
São pessoas que queriam fazer faculdade, se casar, ter uma casa pequena e um carro popular, rir durante vários domingos e envelhecer ao lado da pessoa amada cheias de netos em volta para ouvirem as histórias de sua juventude.
São, acima de tudo, pessoas que não conseguiram por algum motivo, e aí está a minha indignação por tanto desprezo. Diante de tantos jornais sensacionalistas, alguém morrer de fome e frio não faz mais tanta diferença assim, não é? Desde que você esteja no conforto de sua nicasa, desfrutando de seu banquete, enquanto reclama que, pela miléééésima vez a sua mãe queimou o arroz, alguém daria tudo para estar no seu lugar. Alguém que poderia ter a vida que você têm. E que a valorizaria muito mais, acredite.
A faculdade não rolou, a nota de corte tava bem alta, e você nem acha um emprego legal pra conseguir pagar a tal faculdade dos sonhos.
Você é órfão.
Você faz uma escolha errada.
São tantas circunstâncias e possibilidades tão prováveis que poderiam transformar você, em, adivinhe só, alguém que implora por 1 real na porta de uma rodoviária.
Triste, não?
Não,
Triste é passar por tudo isso na vida e ser ignorado. É ser julgado por sua aparência que, não mostra nem metade do que você passou.
Quantas pessoas potenciais temos na rua.
Um arquiteto que não tinha dinheiro nem condições de estudar.
Uma miss que teve sua pele destruída pelo frio excessivo.
Um médico que perdeu os pais muito cedo.
Uma advogada que decidiu fugir de casa pois era maltratada.
São tantas as pessoas que estão nessa situação, que esquecemos o que elas são. Exato; pessoas.
Nada mais, nada menos do que alguém que poderia ser sua mãe, seu pai, seu avô, seu filho, mas foi adotado pelas ruas. O pai do mundo, a mãe da fome. Alguém que ninguém quer mais. Alguém que espera pela morte, ou por uma forma de modificar a sua vida.
Alguém que ora a noite por uma ajuda, mas infelizmente é chutado.
O cara invisível não é um super-herói, é alguém que foi esquecido pelo tempo.
Alguém que não está dentro dos padrões, mas, afinal, quem está? Alguém que a vida o possuiu. Apenas isso.
Boa noite, na sua cama quentinha.
Tente dormir bem, como todas as outras pessoas.

Seja diferente enquanto você ainda pode ser.

Letícia Mucci.

4 comentários:

  1. Sem dúvida esse foi o melhor post que li nessa madrugada.
    E concordo com você, sem tirar nem por.
    Minha mãe abriu uma sorveteria faz uns dois meses e em dezembro, veio um amigo dela lhe dando conselhos para ajudá-la a crescer e beleza, achei isso bacana até o momento em que ele disse "se vier um mendigo, coloca ele pra fora, manda ele se tirar que por causa de um cara fedido desses você acaba perdendo cliente" oi? Só tenho 16 e posso não entender nada sobre comércio, mas sou humana e o "cara fedido" também. Na semana seguinte veio um morador de rua pedindo água e uma bola de sorvete, já que estava muito calor e ele estava faminto. Minha mãe não teve coragem de expulsá-lo do recinto e muito menos negar um sorvete e água. Eu também não tenho coragem. Não é nem questão de ter dó e sim de ser humano, de ser gentil.
    Sei sim, que existe muita gente desonesta nesse mundo, drogada e mentirosa, mas tem como diferenciar? Por acaso a gente nasce com plaquinha na testa nos definindo?
    Não digo para que você dê todos seus bens materiais, todo seu dinheiro para um morador de rua mas não custa nada dar uma ajudinha quando puder, sabe? E se não quiser dar "cincão" que dê um lanche e uma água. O mundo não precisa de tanto desprezo e repulsa para com essas pessoas. Afinal, daqui uns anos pode ser eu ou você.

    queissobela.blogspot.com

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    1. Muito obrigada, Isa.
      Eu também não tenho coragem de ignorar, ou simplesmente fingir que eles não existem, poxa, né? O que custa ajudar?
      Eu enxergo cada membro de minha família toda vez que eu encontro com um morador de rua por aí.
      Fico muito feliz que tenha gostado do post, e espero que volte mais vezes.
      PS: Adorei a atitude da sua mãe de não menosprezá-los.
      PS2: Visitei seu blog e adorei!
      Beijos.
      Lê <3

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  2. Olá meninas do "conexão"...se tem algo que me derruba "a cara" é ver estas pessoas na rua,desprotegidas e vulneráveis a qualquer coisa,e de ruim infelizmente.
    Sem perspectiva de vida,de melhoria...sem saber de terão o que comer ao fim da noite,se acordarão no dia seguinte...e o que abala ainda mais a "minha alegria" é quando vejo crianças nesta situação...que nem tiveram tempo de tentar fazer algo para estarem naquela situação.
    Esse mundo tem muito o que aprender...muito a evoluir...porque em vez de evoluirmos...estamos retrocedendo.
    Gostei muito do seu texto!
    Inscrita aqui no blog com todo prazer!
    www.meninabymuher.blogspot.com.br

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    1. Beth, faço de suas palavras, as minhas.
      Posso até parecer muito ingênua e sonhadora, mas, olha, sonho em ajudar muitos moradores de rua por aí. Principalmente as crianças, que, nunca erraram pra estar ali, apenas estão.
      Espero que volte sempre pro blog, adorei seu comentário.
      PS: Você é linda. Fiquei com inveja boa, hahah!
      Beijos.
      Lê <3

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